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domingo, 23 de agosto de 2009

Sem vida a morte não tem graça alguma....



Acordei e lá eu estava
Faca na mão e sangue por todos os lados
Não sabia o que tinha feito
Ou se tinha ao menos feito algo

Andei em direção a porta, o silencio era a minha companheira
Não lembrava de nada
Não sentia nada
Mas mesmo assim algo em mim me fazia feliz

Abro a porta e só vejo corpos
Pessoas caídas, crianças, mulheres e todo tipo de ser humano
Não fizeram rodeios ou discriminações
O que será que teria acontecido, somente eu com esta faca na mão

Andei pelo vale da morte e a nada temi pois o silencio se fazia minha companheira
Um barulho e um susto, tinha pisado sobre um osso, não era nada demais para eu me assustar
De repente deu vontade e eu corri, o mundo parecia ser meu
Nada poderia me deter, sem leis, sem duvidas e sem a necessidade de ideais

Cansei e me vi sozinho com a faca na mão
Não havia ninguém ali
Apenas corpos sem vida
Todos caídos, seus rostos não me davam nem a ligeira pista do que teria acontecido

Uma pessoa sentada e então corri
Ei você! Eu gritei de longe
Mas ao chegar ao lado de tal pessoa vi seu olhar parado para o horizonte
Havia morrido e ali ficou, como se esperasse algo, tinha inveja daquela paz que via naquele rosto

Me coloquei a andar e falar sozinho
Por vezes joguei minha faca aos céus na esperança que alguém a segurasse
Tudo em vão, a faca sempre voltava
Coloquei as mãos em meus bolsos e lá achei uma carta

Toda suja de sangue, a carta ainda estava fechada
Fiquei curioso e resolvi não abrir a carta
Afinal enquanto eu não a abrisse poderia ficar imaginando o que haveria nela
Uma carta de amor, despedida ou um recado? Em um mundo sem vida aquela carta era a minha alegria

Por horas caminhei e ninguém encontrei
Senti saudades das pessoas passeando e vivendo com alegria
Mas ai lembrava do ódio, da dor e da solidão que muitos sentiam
E aquele sentimento se esvaia

Bateu a fome e fui em direção a um supermercado
As portas ainda funcionavam, abriram assim que fiquei próxima a elas
Fui caminhando e por pessoas mortas caminhei
Parecem ter morrido enquanto faziam compras, algumas com seus filhos ainda estavam próximas aos seus carrinhos

Quantos alimentos só para mim, poderia pegar o que quisesse, afinal eu estava só
Sem problemas de dinheiro, sem discussões e sem preocupações
O mundo naquele momento era meu, eu poderia fazer o que quiser
E devo confessar que mesmo por acidente acabei pisando em algumas cabeças, o barulho de osso quebrando me dava sustos, caia na risada por pensar ser alguém perto de mim

Começou anoitecer e resolvi entrar em uma casa
Escolhi a mais linda casa daquela rua
A porta estava aberta como um convite, afinal como único já não haviam barreiras para mim
Me sentei ao sofá, uma menina parecia dormir, mas sua pele esbranquiçada me dava a verdade sobre seu estado, seu corpo gelado não tinha vida a tempos

Troquei os canais da TV, somente chiados eu ouvia, afinal sem ninguém alem de mim quem iria transmitir o jornal nacional?
Ta chato aqui não acha? Falei para a menina, sem resposta nenhuma é claro
Deitei ao seu lado e ali adormeci

Após algumas horas acordei e lá eu estava, deitado em um sofá de uma casa que eu não conhecia com uma menina morta ao meu lado e uma faca na mão
Tentei passar seu braço gelado sobre o meu pescoço como se ela estivesse me abraçando, mas ela já estava dura demais, não iria conseguir afeto nenhum daquele corpo

Tenho uma carta sabia? Eu disse a menina, deve ser de alguma menina bonita, você não esta com ciúmes né? E eu ria sem parar com isso.
Depois de algumas horas de conversa com aquela menina morta sobre a carta que eu não tinha aberto ainda resolvi sair do sofá e andar pela casa

Subi aos andares superiores da casa, passei de quarto em quarto e no fim do corredor encontrei uma porta semi aberta
Entrei e lá vi um menino, não tinha mais de sete anos com um cachorro em seus braços, vermes já caiam da boca daquele lindo cachorrinho, fiz uns dois carinhos nele mas não tive nenhuma reação, em respeito ao acolhimento que aquela casa me deu me certifiquei que tudo estava bem antes de sair dali

Mais um dia e eu passeando naquele lindo dia de sol
O cheiro na era nada agradável, os corpos estavam podres em sua maioria
Mas o engraçado, não haviam corvos nem urubus
Os Ceifadores da morte não tinham perdoado nem aos animais

Ai comecei a pensar por que só eu sobrevivi neste mundo?
Confesso que tentei voltar a casa onde acordei com a minha faca na mão
Mas claro que não achei, em minha alegria andei sem ao menos prestar atenção no caminho
Mas do que adiantava se eu encontra-se, não traria os mortos a vida certo?

Resolvi entrar em um shopping que vi em minha frente
Tudo funcionava, os letreiros, as luzes e a musica, tudo estava mais vivo do que nunca
Fui ao fliperama e como me diverti, poderia pegar quantas fichas eu quisesse que não teria ninguém para me impedir

Depois de algum tempo me enjoei e me lembrei do cinema, subi as escadas rolantes e vi as salas
Tentei ver se ainda tinha pipoca, o rapaz morto ao lado da maquina na certa tinha esquecido de desligar a maquina, quanta pipoca estourando tinha ali
Peguei um saco grande, fui a maquina de coca-cola e enchi o copo
Ao entrar na sala de cinema vi que o filme estava rodando, na certa o mesmo filme se repetia após acabar, varias pessoas sentadas, o cheiro ate que já não mais me incomodava.

Sentei na ultima fileira, sei que empurrei um cara para conseguir lugar, mas com aquela cara ate enquanto era vivo deveria ser um zé-ruela
Que menina linda estava ao meu lado, baixei sua blusa e gritei: olha o seio dela galera, ninguém olhou para trás, comi minha pipoca enquanto o filme rolava, me despedi da garota, voltei a sua blusa ao lugar e lhe pedi desculpas, não poderia ficar mal com ela na certa eu iria voltar ali e estava pensando em repetir a mesma brincadeira

Fui a umas lojas e ate corri pelado, afinal quem iria me repreender?
Olha fiquei bonitão com aquelas roupas novas
Quando eu já estava saindo do shopping lembrei da carta, tinha deixado ela na minha calça antiga, chorei desesperado enquanto tentava lembrar em qual loja eu a tinha deixado, e finalmente a encontrei, Ufa; quase perdi a minha carta! Pensei naquela hora

Passei no caminho da saída por uma linda loja de eletrodomésticos e fui na sessão de cozinha
Que lindas facas ali havia, uma mais linda que a outra peguei uma bem grande e dali sai
Corri bem feliz, pois tinha feito tudo que eu desejava fazer naquele dia

Estava novamente anoitecendo e fui a procura de uma nova casa
Entrei na primeira que eu vi em minha frente, não fiz escolhas dessa vez
Uma família estava toda na cozinha, com os rostos caídos sobre os pratos ainda com
Comida
Fiquei olhando para a janela, apenas silencio para onde eu olhava

Finalmente decidi abrir a carta
O sangue já tinha secado e o papel estava quase todo vermelho
Reconheci a minha letra na hora, era uma carta de despedida
Para ser mais claro aquilo era uma carta de suicídio assinada por mim

Aquela carta foi o meu inferno
Depois que eu li aquela carta uma duvida surgiu
Será que eu estava caminhando entre mortos, ou era o único a estar morto?
Levei isso comigo enquanto saia daquela casa

Pensei em tentar me matar e tirar a duvida
Mas aquilo remoía a minha cabeça
Se eu estivesse vivo morreria e seria mais um entre tantos
E se eu estivesse morto? Aquilo realmente me machucaria?
Em silencio novamente me pus com a faca na mão olhando para a janela
Sabendo que levaria aquela duvida ate o fim de meus dias
Isso se eles realmente chegassem...

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